A porta da verdade estava aberta
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.
Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só conseguia o perfil de meia verdade.
E sua segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam.
Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso
onde a verdade esplendia os seus fogos.
Era dividida em duas metades
diferentes uma da outra.
Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era perfeitamente bela.
E era preciso optar. Cada um optou
conforme seu capricho, sua ilusão, sua miopia.
Segundo informado no site algumapoesia.com.br, este poema apareceu inicialmente no livro Corpo, de 1984, um ano antes da publicação de Contos Plausíveis, de onde foi extraída esta versão. Entre as duas edições há ligeiras mudanças.
Em Corpo, o título era "Verdade". Depois foi modificado para "A Verdade Dividida". No terceiro verso da terceira estrofe, o que era "seus fogos", passou a ser "os seus fogos". Na mesma estrofe, o que antes era "metades" transformou-se em "duas metades". Na última estrofe, em lugar de "perfeitamente bela", como se lê ao lado, estava "totalmente bela". O trecho "E carecia optar" evoluiu para "E era preciso optar". A frase final permaneceu a mesma, mas a palavra "conforme" pertencia, antes, ao penúltimo verso.
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